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segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Bárbara

- Eu acho que ela exagerou

- Eu não.

- Você é amiga de quem? Minha ou dela?

- Desculpa, Bárbara, mas eu teria feito pior.

- Mas precisava bater no rosto?

- Você devia ter considerado essa possibilidade.

- Como eu vou trabalhar amanhã?

- Acho que se passar uma base, dá pra disfarçar.

- Meu rosto tá inchado, roxo e flácido.

- Pensa pelo lado positivo, é só do lado direito.

- E disforme!

- A gente põe um gelo hoje e capricha na maquiagem amanhã.

- Acho que eu vou falar que estou com gripe.

- E o vírus saiu de você e te encheu de porrada?

- Não tá ajudando.

- To sendo realista. Mantenha o fato, mude a causa.

- Como assim?

- Sei lá, fala que foi assaltada.

- E o ladrão levou minha bolsa e meu olho direito?

- Ele bateu em você pra conseguir roubar a bolsa.

- Eu podia acusar o Paulo e usar a Lei Maria da Penha.

- Que Paulo?

- Meu ex.

- Isso é patético.

- Não consigo ver meu olho!

- Ficar olhando no espelho não ajuda.

- ...

- Bárbara... Você tá chorando?

- Não, meu olho não parou de lacrimejar desde que ela me bateu.

- Ahn.

- Ainda acho que ela não exagerou.

- Achei que ela quereria saber.

- Ela é casada com ele há 12 anos. Ela provavelmente já sabia.

- As vezes, ela não tem conhecimento de causa.

- Que?

- As vezes ela não sabe que ele é ruim porque ela só namorou ele a vida inteira.

- Na verdade, isso até faz sentido.

- Viu!

- Mas você ainda não tem nada a ver com isso.

- Eu fui ser uma boa amiga alertando ela.

- Você não desiste!

- Do que?

- De provar que você tá certa.

- Não é isso, eu to tentando analisar dos dois lados.

- Na boa?

- ...

- Não.

- Talvez tenha sido meio inapropriado, mas ela exagerou.

- Meio inapropriado!?

- Muito inapropriado.

- Você tá me cansando.

- Porquê?

- Você tem noção do que você disse?

- Mais uma vez: você é amiga de quem? Minha ou dela?

- Pelo amor de deus Bárbara!Você disse que semana passada achou o marido dela ruim de cama!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Primeira semana

Não era dor e definitivamente não era prazer. Não era medo, não era vontade de voltar, não era frio nem quente, era novo. Era vazio. Era cheio, leve. Não era desespero, não era insensatez. Não era palpável, não era visual. Não era literal. Era cortante, confortante. Era Saudade.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Inflada com ar

Parada, de olhos vendados, em frente a um precipício. Uma fita verde lhe cobrindo os olhos. Verde cor de folha, cor de vida.

Os pés imóveis e o precipício se aproximando dos dedos tamborilantes. Ela ia cair. O precipício caminhava na velocidade do tempo, das horas.

Inflada com ar. Cheia de nada, mas ainda assim cheia. Cheia de dores que não tem nome. De amores que não vão ser. Cheia de futuro renegado, de futuro sem prospecto. Cheia de penumbra, de vultos e desfoque. Como uma bexiga de gás hélio que flutua até estourar pela pressão. Ela ia cair.

Imóvel, a espera da chegada do vazio ao seus pés. Via verde. Via branco, via nada além de um centímetro a sua frente.

Tinha uma excitação pueril. Tinha uma hesitação pueril. O abismo estava à cinco de seus pés. Em vinte e quatro estaria à quatro. Em noventa e seis estaria à um. Ela ia embarcar.