A vida ia e vinha. Tinha pontos altos e baixos, as vezes tinha os dois ao mesmo tempo. As vezes ela se confundia e achava que estava em um ponto alto e depois de um tempo percebia que na realidade era um buraco com uma iluminação decente.
Há uns dias ela estava pensando em chegar para um ser humano e dizer algumas das coisas tinha como verdades, dizer o que pensava, como se sentia e essas coisas que as vezes é bom tirar do peito.
Ai ela parou e se perguntou: que direito ela tinha? Ninguém havia perguntado. Sempre tivera esse conceito de tentar calar-se quando ninguém a perguntava. No entanto, tinha coisas que precisavam ser ditas, porque, quando caladas, apodrecem as pessoas por dentro. Guardar mágoas vai corroendo, e desequilibrando o emocional, faz as pessoas passarem mal, solta o intestino, faz comer, roer a unha...Essas coisas que todo mundo sente, mas ninguém admite.
Ela queria gritar. Bem perto da cara do indivíduo, para que sua saliva voasse de sua boca e aterrizasse na testa dele, nos cílios. Afogaria o infeliz em palavras e em baba. Mas ela se convencia que era maior que isso, que teoricamente era equilibrada, ou pelo menos deveria ser. E então admitiu: Sou nada.
Não era evoluída. Queria jogar a merda no ventilador e ofender aquele ser humano como nunca ofendera ninguém. Falar tudo o que sentia até o ponto em que os bisnetos dele tivessem gastrite e não soubessem o porquê.
FILHO-DA-PUTA! e a saliva voaria! ESCROTO DE MERDA! E o cabelo dele se moveria para trás pelas ondas sonoras! MENTIROSO TRAIÇOEIRO DO CARALHO! E ela poderia ver as gotinhas com o seu DNA dançando testa abaixo, até atingir os cílios, e se tudo desse certo uma delas acertaria o olho.
Mas de que que adiantaria? Pra ele nada, só perderia o rumo por alguns segundos. Pra ela? Tiraria do peito e jogaria pro mundo. E seu desprezo se misturaria com felicidade, raiva, tranquilidade e todas as outras energias que as pessoas exalam. E depois de um mês o cara viraria mais uma história de boteco, mais um infeliz que tinha enganando 28 trouxas.
Engraçado é que a impressão que ela tinha sobre ela mesma é que na realidade 'trouxa' eram os outros. Que ela pelo menos sabia a realidade, com ela o jogo era aberto. Ela confiava que tinha sido clara no pedido de sinceridade, por mais absurda que a mesma fosse. E ainda assim, contra todos os sentidos lógicos, o imbecil usou com ela todas as cartas batidas e repetidas que qualquer pessoa que tivesse visto uma comédia romântica com um vilão escroto saberia identificar. Primeiro veio o 'eu estou mal psicológico', em seguida o 'eu estou mal físico', na sequência o 'Eu trabalho demais' e quando nenhuma dessas funcionou veio a 'tempestade de elogios'.
E então, quando a paciência esvaiu, a inconformidade chegou. E, com o passar do tempo, o cara que parecia legal viraria mais um nada. Um ser insignificante no meio da multidão, e em pouco tempo ela não lembraria ao certo qual foi a história e depois teria aquela sensação de 'conheço, sei que é escroto, não lembro o porquê'. Sua memória era seletiva, ou pelo menos deveria ser.
quinta-feira, 18 de setembro de 2014
quarta-feira, 15 de janeiro de 2014
Lilás
- Oie!
- ...
- Moçooo!, Oie!
- ... Oi...
- Porque você tá sentado aqui?
- Tô esperando meu ônibus.
- Ah.. entendi.
- ...
- ...
- Você não é meio nova pra estar sozinha na rua uma hora dessas?
- Não. Você não é muito velho?
- Velho pra que?
- Não sei, velho pra ser novo. Tem ruga aqui e aqui ó.
- ... O que é que você quer? Dinheiro? Toma esse troco e vai comprar uma bala.
- Não.. não gosto de bala. Quero saber teu nome.
- Meu nome?
- É. Você não tem um?
- Tenho... todo mundo tem nome.
- Nem todo mundo. Qual é seu nome?
- Manoel.
- Uaaau, que nome azul!
- Oi?
- Oi o que?
- Como assim que nome azul?
- Seu nome tem cor de azul, escuta: Ma-no-el.
- Nome não tem cor.
- Tem sim, o meu é lilás.
- E qual o teu nome?
- Lilás.
- Não to falando da cor, to perguntando qual o teu nome.
- Meu nome é Lilás.
- Ah.. hun.. bonito. Cadê sua mãe?
- Tá no céu.
- Nossa, desculpa, se eu soubesse não tinha perguntado.
- Não tem problema, eu não me incomodo com ela ser aeromoça.
- Ah, ela é aeromoça? Pensei que tivesse morrido.
- Não, ainda não. Só daqui 37 anos.
- Como assim?
- Minha mãe vai morrer daqui a 37 anos... Tem um tempão ainda.
- Não tem como você saber isso.. daqui quanto tempo a sua mãe vai morrer.
- Tem sim, eu sei o tempo de todo mundo.
- Ah sabe?
- Sei.
- Então quando eu vou morrer?
- Pera, deixa eu ver meu relógio.
- Você tem um relógio de bolso?
- Sim e de acordo com ele o senhor tem mais 10 minutos.
- QUE!? Menina, você é louca? Eu não vou morrer daqui dez minutos!
- Não mesmo, agora são nove.
- Do que você ta falando? Sai daqui!
- Mas o senhor prefere morrer sozinho?
- Não prefiro morrer sozinho, mas também, não vou morrer.
- Rá-rá-rá, Manoel, você acha que é imortal?
- Não... Só não acho que vou morrer agora.
- Cada um acha o que deve achar, e agora não vai mesmo só daqui 8 minutos.
- Você é louca, tem algum tipo de problema.
- Sabia que pessoas de nome azul quando morrem vão pro mesmo lugar que todas as outras pessoas com o nome azul?
- Não, não sabia.
- Você é casado?
- Sou.
- Como é o nome da sua mulher?
- Porque você quer saber isso?
- Pra ver se o nome dela é azul também. Aliás, você deveria ligar pra ela pra se despedir.
- Eu NÃO vou morrer.
- Tá.. e o nome dela é?
- Magda.
- Ahhh, o nome dela é Laranja. Liga pra ela.
- Não tem porque ligar pra ela, eu vou chegar em casa em 20 minutos.
- Não o senhor vai morrer em 6.
- Para de fazer essa contagem regressiva!
- Ok, não te aviso mais. Mas deveria ligar pra ela ou pros seus filhos.
- Eu não tenho filhos.
- Nem eu...
- Você não tem idade pra ter filhos. Aliás, quantos anos você tem?
- Cinco, que aliás é o mesmo número de minutos que você tem de vida.
- Vou ligar pra Magda só pra garantir.
- Fala que ama ela, e não esquece de avisar que você já trocou o botijão de gás.
- Que? Pera, como você sabe disso?
- Eu sei de muitas coisas.
- Você é uma menina muito criativa, isso sim.
- Liga pra ela!
- Vou ligar.
- ...
- ... ela não me atende.
- Deixa um recado.
- Vou deixar um recado falando que uma garotinha de 5 anos, que chama Roxa, me pediu pra ligar porque ela tava fazendo contagem regressiva da minha morte e acabou de me avisar que a gente não vai
ficar junto depois da morte? Não, não vou
- Três minutos, Manoel.
- Tá, já que você sabe tantas coisas, eu vou morrer de quê?
- Você vai enfartar.
- Eu nunca tive problemas no coração.
- Pois vai ter um hoje. E dos grandes. Aliás, meu nome não é Roxa, é Lilás.
- Tá bom, Lilás.
- Fecha os olhos, Manoel. E se acalma pra ir embora feliz.
- Sai daqui, Lilás, vai achar teu pai.
- Fecha os olhos, por favor, Manoel.
- Tá, fechei.
- Dá a mão pra mim.
- Ok, mãos dadas.
- Tchau, Manoel.
- Tchau, Lilás.
- Você devia ter ligado pra Magda.
E o corpo do senhor despencou no banco.
- ...
- Moçooo!, Oie!
- ... Oi...
- Porque você tá sentado aqui?
- Tô esperando meu ônibus.
- Ah.. entendi.
- ...
- ...
- Você não é meio nova pra estar sozinha na rua uma hora dessas?
- Não. Você não é muito velho?
- Velho pra que?
- Não sei, velho pra ser novo. Tem ruga aqui e aqui ó.
- ... O que é que você quer? Dinheiro? Toma esse troco e vai comprar uma bala.
- Não.. não gosto de bala. Quero saber teu nome.
- Meu nome?
- É. Você não tem um?
- Tenho... todo mundo tem nome.
- Nem todo mundo. Qual é seu nome?
- Manoel.
- Uaaau, que nome azul!
- Oi?
- Oi o que?
- Como assim que nome azul?
- Seu nome tem cor de azul, escuta: Ma-no-el.
- Nome não tem cor.
- Tem sim, o meu é lilás.
- E qual o teu nome?
- Lilás.
- Não to falando da cor, to perguntando qual o teu nome.
- Meu nome é Lilás.
- Ah.. hun.. bonito. Cadê sua mãe?
- Tá no céu.
- Nossa, desculpa, se eu soubesse não tinha perguntado.
- Não tem problema, eu não me incomodo com ela ser aeromoça.
- Ah, ela é aeromoça? Pensei que tivesse morrido.
- Não, ainda não. Só daqui 37 anos.
- Como assim?
- Minha mãe vai morrer daqui a 37 anos... Tem um tempão ainda.
- Não tem como você saber isso.. daqui quanto tempo a sua mãe vai morrer.
- Tem sim, eu sei o tempo de todo mundo.
- Ah sabe?
- Sei.
- Então quando eu vou morrer?
- Pera, deixa eu ver meu relógio.
- Você tem um relógio de bolso?
- Sim e de acordo com ele o senhor tem mais 10 minutos.
- QUE!? Menina, você é louca? Eu não vou morrer daqui dez minutos!
- Não mesmo, agora são nove.
- Do que você ta falando? Sai daqui!
- Mas o senhor prefere morrer sozinho?
- Não prefiro morrer sozinho, mas também, não vou morrer.
- Rá-rá-rá, Manoel, você acha que é imortal?
- Não... Só não acho que vou morrer agora.
- Cada um acha o que deve achar, e agora não vai mesmo só daqui 8 minutos.
- Você é louca, tem algum tipo de problema.
- Sabia que pessoas de nome azul quando morrem vão pro mesmo lugar que todas as outras pessoas com o nome azul?
- Não, não sabia.
- Você é casado?
- Sou.
- Como é o nome da sua mulher?
- Porque você quer saber isso?
- Pra ver se o nome dela é azul também. Aliás, você deveria ligar pra ela pra se despedir.
- Eu NÃO vou morrer.
- Tá.. e o nome dela é?
- Magda.
- Ahhh, o nome dela é Laranja. Liga pra ela.
- Não tem porque ligar pra ela, eu vou chegar em casa em 20 minutos.
- Não o senhor vai morrer em 6.
- Para de fazer essa contagem regressiva!
- Ok, não te aviso mais. Mas deveria ligar pra ela ou pros seus filhos.
- Eu não tenho filhos.
- Nem eu...
- Você não tem idade pra ter filhos. Aliás, quantos anos você tem?
- Cinco, que aliás é o mesmo número de minutos que você tem de vida.
- Vou ligar pra Magda só pra garantir.
- Fala que ama ela, e não esquece de avisar que você já trocou o botijão de gás.
- Que? Pera, como você sabe disso?
- Eu sei de muitas coisas.
- Você é uma menina muito criativa, isso sim.
- Liga pra ela!
- Vou ligar.
- ...
- ... ela não me atende.
- Deixa um recado.
- Vou deixar um recado falando que uma garotinha de 5 anos, que chama Roxa, me pediu pra ligar porque ela tava fazendo contagem regressiva da minha morte e acabou de me avisar que a gente não vai
ficar junto depois da morte? Não, não vou
- Três minutos, Manoel.
- Tá, já que você sabe tantas coisas, eu vou morrer de quê?
- Você vai enfartar.
- Eu nunca tive problemas no coração.
- Pois vai ter um hoje. E dos grandes. Aliás, meu nome não é Roxa, é Lilás.
- Tá bom, Lilás.
- Fecha os olhos, Manoel. E se acalma pra ir embora feliz.
- Sai daqui, Lilás, vai achar teu pai.
- Fecha os olhos, por favor, Manoel.
- Tá, fechei.
- Dá a mão pra mim.
- Ok, mãos dadas.
- Tchau, Manoel.
- Tchau, Lilás.
- Você devia ter ligado pra Magda.
E o corpo do senhor despencou no banco.
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