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terça-feira, 14 de agosto de 2012

Modernismo

Era a terceira. em menos de quatro meses após o término, essa era a terceira namorada. Significava muito. Significava que os erros não eram só dela. Quem estragava três relacionamentos em menos de quatro meses, não podia ser perfeito. Ele dizia que o primeiro foi de raiva do término com ela, e o segundo nunca foi explicado, não que ele devesse explicações, afinal ela que terminara tudo quatro meses antes.

Ela já tinha dito que o término fora um erro, que tinha se arrependido, e ele disse que estava com saudades, que queria conversar. Ficou combinado que conversariam quando ela voltasse pra cidade, pelo menos foi o que ela entendeu, mas em menos de três semanas, ele já estava anunciando publicamente que tinha outra.

Ela era fiel. Era fiel a si mesma, fiel ao que sentia e o que tinha dito sobre querer conversar, querer encontrar, querer ver, tocar, beijar. Ela sempre foi honesta. Só não tinha a certeza de que ele também fora. A terceira foi a gota d'água. Quem é sincero sobre a saudade não arranja outra com tanta eficiência.

Ela tinha uma filosofia, de que se um dia fosse ficar com alguém seria por mútua vontade. Não queria ter que se esforçar incessantemente para provar que estar com ela era o suficiente. Queria alguém que soubesse disso, e que não estivesse sempre a beira de cair em tentação. No entanto, queria que ele soubesse disso. E não outro qualquer.

Não tinha mais conversa, não tinha mais nada a ser dito. Só restava a ser sentido. Arrumou suas coisas e decidiu que voltaria a cidade. Mas minutos antes de avisá-lo que estaria de volta, viu que agora existia a a terceira. Olhou na tela do computador e só conseguia ver que agora tinha mais uma. Sentiu um calor, uma raiva que se espalhava partindo do estômago. Uma raiva não dele, uma auto-depreciação. Como pudera não perceber os sinais que ele sempre emitia de que ela também era mais uma, ela fora a terceira para outra.

Ela não era especial, e tudo aquilo que ela achou que fosse só existiu na impressão. Ele era um homem, como outro qualquer, que procurava alguma qualquer, que não importava se era ela, ou as outras três. Ela fazia parte do montante.

Fazia parte do montante. Do mon-tan-te. A realização disso, fez o vidro se quebrar. A ilusão havia se partido. E por mais que aceitasse, que nada nunca fora tão especial quanto tinha acreditado, tudo que queria era que ele viesse e juntasse os cacos estilhaçados e começasse a colar. Pedaço a pedaço, transformando-os em uma obra de arte. Um picasso, que mesmo torto, e mesmo com rachaduras de tinta, se mostrava completo e pronto para ser exposto, visto e apreciado. Queria pra vida um romance modernista. Queria ser 'A boba'. Sem ser tripudiada. Queria ter um ‘homem amarelo’, com um toque de azul. Queria ser 'Guernica', porque onde existe guerra existe amor. Queria ter arte.

2 comentários:

  1. Sensacional, Ju!

    "Como pudera não perceber os sinais que ele sempre emitia de que ela também era mais uma, ela fora a terceira para outra." - the best part...

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  2. Incrível! Você escreve maravilhosamente bem!

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